Porque a ciência não consegue comprovar a existência de Deus?
Talvez a ciência possa nunca ser capaz de comprovar a existência de Deus, principalmente se ele estiver além das leis da física
Caso haja um Deus responsável pela criação do vasto universo e por todas as sutilezas das leis físicas que o regem, surge uma indagação intrigante: estará esse Ser vinculado às mesmas leis que estabeleceu? Será que detém a capacidade de transcender suas próprias regras, como por exemplo deslocar-se a uma velocidade superior à da luz, possibilitando assim a sua presença simultânea em dois pontos distintos do espaço?
Essa foi uma indagação feita por Einstein em um seminário, e que faz um grande primeiro paralelo sobre até que ponto é possível colocar em voga a possível comprovação de Deus, tendo em vista que se existe um Ser criador de tudo, ele poderia estar acima das leis físicas, o que vai muito além daquilo que podemos alcançar, logo sendo incapaz que consigamos comprovar a sua existência.
Dessa maneira se considerarmos que a habilidade de Deus em transcender as leis da física é limitada, sua magnitude como entidade suprema poderia não corresponder às expectativas. No entanto, se ele tivesse a capacidade de fazê-lo, surge a pergunta: por que não encontramos quaisquer sinais de que as leis fundamentais da física tenham sido violadas em algum momento no universo?
Ciência pode não ser capaz de comprovar a existência de Deus
Para investigarmos essa indagação, é necessário analisá-la minuciosamente. Primeiramente, questionamos: teria Deus a capacidade de superar a velocidade da luz em suas deslocações? Consideremos essa pergunta em seu sentido mais literal. A velocidade da luz é conhecida por atingir aproximadamente 3 x 10⁵ km/s.
Recordamos dos ensinamentos escolares que nada pode ultrapassar a velocidade da luz, nem mesmo a icônica nave USS Enterprise da série Jornada nas Estrelas, quando operando em sua potência máxima com motores de cristais de dilítio.
Mas será isso uma verdade absoluta? Há alguns anos, um grupo de físicos levantou a hipótese da existência das chamadas partículas táquions, que supostamente viajariam a velocidades superiores à da luz. Contudo, acredita-se ser altamente improvável que essas partículas realmente existam.
Caso fossem reais, carregariam uma massa imaginária, e a estrutura do espaço-tempo sofreria distorções, abrindo margem para violações da causalidade (e talvez até mesmo um dilema para Deus).
Até o momento, não se observou qualquer objeto capaz de ultrapassar a velocidade da luz, o que, por si só, não traz implicações diretas sobre Deus. Isso simplesmente reforça o entendimento de que a luz é extremamente veloz.
A discussão se torna mais fascinante quando se considera a distância que a luz percorreu desde o início dos tempos.
Partindo do pressuposto da cosmologia tradicional do Big Bang e levando em conta a velocidade da luz de 3 x 10⁵ km/s, é possível calcular que a luz já percorreu cerca de 10²³ km ao longo dos 13,8 bilhões de anos de existência do Universo — ou, para ser mais preciso, do Universo observável.
Devido à expansão do Universo a uma taxa de aproximadamente 70 km/s por Mpc (sendo 1 Mpc equivalente a 1 Megaparsec, ou cerca de 3 x 10¹⁹ km), as estimativas atuais indicam que a distância até os limites do Universo é de cerca de 46 bilhões de anos-luz.
À medida que o tempo avança, o espaço se dilata e a luz precisa percorrer distâncias ainda maiores para chegar até nós.
Há um vasto cosmos além de nossa percepção, mas o objeto mais remoto que conseguimos visualizar é a galáxia GN-z11, captada pelo Telescópio Espacial Hubble.
Ela se encontra a aproximadamente 10²³ km, ou 13,4 bilhões de anos-luz de distância, indicando que a luz dessa galáxia levou 13,4 bilhões de anos para nos alcançar. No entanto, no momento em que essa luz foi emitida, a galáxia estava a apenas três bilhões de anos-luz de distância da Via Láctea, nossa própria galáxia.
Não temos meios de observar ou contemplar a totalidade do Universo que se desenvolveu a partir do Big Bang, pois não se passou tempo suficiente para que a luz das primeiras frações de segundo chegasse até nós.
Alguns argumentam que, por essa razão, não podemos afirmar com certeza se as leis da física poderiam ser transgredidas em outras regiões cósmicas — talvez tais leis sejam apenas normas locais e contingentes. Isso nos conduz a uma reflexão que vai além dos limites do próprio Universo.
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Uma exploração da estranheza quântica
Vamos agora mergulhar na contemplação da capacidade divina de estar presente em múltiplos lugares simultaneamente. Grande parte da ciência e tecnologia que fundamentam a exploração espacial encontra suas raízes na teoria contraintuitiva que governa o microcosmo dos átomos e partículas: a mecânica quântica.
Essa teoria nos revela um fenômeno intrigante chamado de entrelaçamento quântico, onde partículas se encontram misteriosamente conectadas. Se duas partículas estão entrelaçadas, manipular uma delas implica em automaticamente afetar a outra, mesmo que estejam distantes e sem interação aparente.
Embora existam descrições mais complexas do entrelaçamento, essa explicação simplificada nos permite prosseguir.
Imagine uma partícula que se divide em duas subpartículas, A e B. As propriedades das subpartículas devem, ao se somarem, reproduzir as características da partícula original — um princípio fundamental da conservação.
Por exemplo, todas as partículas possuem uma característica quântica conhecida como “spin”, que pode ser imaginado de forma simplificada como minúsculas agulhas de uma bússola interna.
Se a partícula original tiver um “spin” zero, uma das subpartículas deve possuir “spin” positivo e a outra, “spin” negativo. Isso implica que cada subpartícula, A e B, tem igual probabilidade de apresentar “spin” positivo ou negativo. (Segundo a mecânica quântica, as partículas existem em uma combinação de estados diferentes até que sejam efetivamente medidas.)
As propriedades de A e B não são independentes entre si — estão entrelaçadas — mesmo que se encontrem em laboratórios separados ou em diferentes pontos do universo.
Suponha que você meça o “spin” de A e encontre um resultado positivo. Imagine agora que uma amiga meça o “spin” de B no exato instante em que você mediu A. Para que o princípio da conservação seja respeitado, ela deve encontrar um resultado negativo para o “spin” de B.
Aqui é onde a complexidade emerge: como a subpartícula B tinha uma chance igual de apresentar “spin” positivo ou negativo, seu estado de “spin” “se transforma” instantaneamente no momento em que o estado de “spin” de A é medido como positivo.
Em outras palavras, a informação sobre o estado de “spin” é transmitida entre as duas subpartículas instantaneamente. Essa transferência de informações quânticas parece ocorrer mais rápido que a velocidade da luz.
Dado que o próprio Einstein denominou o entrelaçamento quântico como uma “ação fantasmagórica à distância”, é compreensível que encontremos esse fenômeno verdadeiramente peculiar.
Assim, emerge algo que parece superar a velocidade da luz: a informação quântica.
Embora isso não prove nem refute a existência de Deus, essa perspectiva nos permite considerar Deus em termos físicos. Poderíamos imaginar Deus como uma teia de partículas entrelaçadas, transmitindo informações quânticas de um lado para o outro, ocupando diversos lugares simultaneamente. Talvez até mesmo habitando múltiplos universos?
O fato é que toda essa questão pode deixar claro que comprovar a existência de Deus possa ser algo que vá muito além da nossa compreensão, e que de fato, poderemos ficar até o fim de nossos dias buscando alternativas para comprovar algo que ao final poderemos não ter a capacidade de comprovar.
Este é um conteúdo adaptado pelo Meu Valor Digital, com informações da BBC.
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