No topo do Monte Aragats, na Armênia, uma estação de pesquisa tem documentado um fenômeno intrigante: picos temporários de radiação que ultrapassam em até 100 vezes os níveis de fundo normais. Esses eventos, conhecidos como Thunderstorm Ground Enhancements (TGEs), ocorrem durante tempestades e têm intrigado cientistas ao redor do mundo.
Os TGEs foram detectados pela primeira vez na estação do Space Environmental Center, que foi originalmente criada para estudar partículas carregadas vindas do Sol e de outros corpos celestes.
No entanto, em vez de se tratar apenas de radiação cósmica, os picos de radiação coincidiram com tempestades locais, levando os pesquisadores a focar suas investigações nesses eventos atmosféricos.
Em 2023, um ano particularmente tempestuoso, foram registrados 56 TGEs — o maior número já observado no Monte Aragats.
Esses surtos de radiação ocorrem quando o campo elétrico dentro das nuvens de tempestade ultrapassa um limite crítico, acelerando elétrons livres na atmosfera. Essas partículas, aceleradas a velocidades próximas à da luz, resultam em um fenômeno conhecido como Avalanches de Elétrons Fugitivos Relativísticos.
As tempestades que geram esses campos elétricos poderosos produzem raios cósmicos, detectados na forma de partículas carregadas, como elétrons, além de raios gama de alta energia e nêutrons.
Durante um desses eventos, os detectores da estação registraram 38 partículas por centímetro quadrado, um número expressivo considerando que normalmente os níveis de radiação são muito mais baixos.
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Quando os elétrons acelerados pelas tempestades se movem pela atmosfera, eles colidem com outras partículas, criando fótons conhecidos como raios gama bremsstrahlung. Esses raios gama são tão poderosos que conseguem interagir com os núcleos atômicos, liberando nêutrons em um processo raro e fascinante. Em resumo, os TGEs são resultado direto da interação entre os campos elétricos gerados pelas tempestades e as partículas atmosféricas.
Os pesquisadores notaram que os TGEs ocorrem frequentemente em tempestades no final da primavera e nas noites de verão. Durante esses eventos, os campos elétricos podem atingir até 2.100 volts por centímetro e durar até dois minutos.
Nesse curto espaço de tempo, os elétrons acelerados podem carregar até 60 milhões de elétron-volts de energia cinética, criando uma verdadeira tempestade de radiação.
Curiosamente, os TGEs costumam ser encerrados com a ocorrência de raios. Quando os campos elétricos atingem um nível crítico, a descarga elétrica gerada por um raio “nivelando” as cargas opostas nas nuvens interrompe o processo de aceleração dos elétrons, encerrando o surto de radiação.
Os dados coletados no Monte Aragats revelam que os TGEs não são limitados a pequenas áreas. Durante os maiores eventos, os campos elétricos se estenderam por vários quilômetros quadrados e atingiram altitudes suficientes para afetar um volume considerável da atmosfera.
No entanto, a distribuição dos campos variou ao longo do ano. Nas tempestades de verão, os campos elétricos eram mais uniformes em toda a área de estudo, enquanto no outono, detectores a poucos metros de distância registravam variações significativas nas leituras de radiação.
O estudo dos TGEs no Monte Aragats tem sido tão revelador que os pesquisadores criaram um banco de dados aberto com as observações feitas ao longo de 2023. Este recurso está disponível para cientistas de todo o mundo que desejam se aprofundar nos fenômenos relacionados aos TGEs e explorar suas implicações para a ciência atmosférica e a física das tempestades.
Esse banco de dados promete ser uma ferramenta valiosa para futuras pesquisas sobre a interação entre tempestades e partículas carregadas na atmosfera.
Além de fornecer insights sobre os TGEs, ele também pode abrir portas para novas descobertas sobre a maneira como as tempestades moldam o ambiente e influenciam a distribuição de radiação na superfície da Terra.
As observações feitas no Monte Aragats mostram como fenômenos naturais podem revelar aspectos surpreendentes da física atmosférica. Os TGEs demonstram que, em condições específicas, tempestades podem gerar picos significativos de radiação que, em alguns casos, chegam a rivalizar com eventos cósmicos de alta energia.
Essa pesquisa destaca, mais uma vez, a importância de entender a interação entre o clima terrestre e o espaço, ampliando nosso conhecimento sobre como o ambiente terrestre é impactado por fenômenos celestiais e climáticos.
Fonte: Physical Review D.
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