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União estável sem contrato da direito à meação e herança no inventário?

Com muita frequência a união estável volta às manchetes dos noticiários, quase sempre através de notícias que trazem preocupação a quem vive sob essa “espécie” de família.

Desde o julgamento dos temas 498 e 809 em 2017 no STF já não pode ser admitida distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros (como fazia até então o art. 1.790 do CCB), devendo em todos esses casos ser aplicada a mesma solução que até então era aplicada apenas aos casamentos: as regras do art. 1.829 do CCB.

União Estável

Pois bem, é importante desde já deixar claro que a união estável surge não com a formalização do documento contratual de união estável como alguns ainda pensam.

Seja ele por instrumento público (escritura pública declaratória de união estável) seja por instrumento particular (que pode inclusive ser feito em casa mesmo, sem nem mesmo contar com a participação de advogado).

Para dizer a verdade, união estável acontece com a reunião dos requisitos legais reclamados pelo art. 1.723 do CCB:

  • “Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida visando constituição de família”.

A regra não é de fácil compreensão, nem mesmo para operadores do direito. Dás muito valiosas lições do professor e advogado, Dr. Paulo Lôbo (direito civil. Famílias. 2021) podemos extrair que:

São requisitos legais da união estável, por força do §3º do art. 226 da cf/1988, do art. 1.723 do ccb/2002 e da decisão do stf na adi 4.277/2011: 

  • a) relação afetiva entre os companheiros, de sexo diferente ou de mesmo sexo;
  • b) convivência pública, contínua e duradoura;
  • c) escopo de constituição de família;
  • d) possibilidade de conversão para o casamento. A inexistência de impedimento para o casamento não pode ser considerada requisito, porque pessoa casada separada de fato pode constituir união estável.

Por ser ato-fato jurídico, a união estável não necessita de qualquer manifestação de vontade para produzir seus jurídicos efeitos. Basta sua configuração fática, para haver incidência das normas constitucionais e legais cogentes e supletivas e a relação fática converta-se em fato jurídico. 

A verificação da existência da união estável, em virtude da inexigibilidade legal de qualquer ato das partes ou do poder público, se dá pelos meios comuns de prova de qualquer fato. 

Assim, tendo em vista tratar-se de relação jurídica em que se converteu a relação de fato, quando houver necessidade de prová-la em virtude de negativa de qualquer dos companheiros, ter-se-á de ajuizar ação declaratória (principal ou incidental).

Sua finalidade é exatamente a de declarar a existência ou inexistência da relação jurídica. 

A ação declaratória também poderá ser incidental. A declaração da existência da união estável também pode se dar após a morte de um dos companheiros, com a consequente declaração da dissolução”.

Contrato de união estável

Recomendamos sempre a confecção do contrato de união estável, pois esse, mesmo que não seja requisito, pode facilitar – e muito – a solução no caso de uma extinção de união estável em vida e principalmente devido à morte de um dos companheiros.

Haja vista a necessidade de se comprovar o vínculo para se garantir direitos patrimoniais e direitos previdenciários, inclusive.

De fato, a união estável, como se vê, pode projetar efeitos patrimoniais, tanto na hipótese de dissolução em vida (por conta da sua “extinção”, que muito se assemelha ao que conhecemos por “divórcio” ou “separação” nos casos de casamento) e também na hipótese de dissolução causa mortis (por conta do falecimento de um dos companheiros).

Para os casos de dissolução em vida, para fins de partilha, será muito importante averiguar dois importantes aspectos: a forma de aquisição dos bens e as regras patrimoniais vigentes na união estável. A realização de um contrato de união estável, ainda que isso não se confunda com requisitos para sua configuração, permite afastar a presunção legal da incidência das regras da “comunhão parcial de bens” como deixa claro o artigo 1.725 do CCB.

Casos de partilha

Diferentemente dos casos de partilha resolvida por conta da dissolução da união estável em vida, na partilha que decorre da dissolução em virtude do falecimento de um dos companheiros deverão ser observadas as mesmas regras que seriam observadas caso se tratasse de casamento entre os interessados, afastadas as regras do art. 1.790 do CCB como já determinou o STF.

Nesses casos, com ou sem contrato escrito regulando questões patrimoniais, temos que – sim – o(a) companheiro(a) poderá ser contemplado com herança e meação na mesma sucessão, sendo importante sempre anotar que inexiste no ordenamento jurídico brasileiro ultratividade do regime de bens como muito bem desacatou jurisprudência do STJ (REsp 1.294.404/RS. J. Em 29/10/2015).

No caso, bens particulares – diferentemente dos bens comuns – não admitem a meação, porém podem ser alcançados pelo(a) companheiro(a) supérstite por concorrência na herança, na forma do inc. I do art. 1.829 do CCB.

Exemplificam os bens particulares, por exemplo, aqueles bens anteriores à constituição da união estável (comprados pelo falecido, por exemplo, quando ainda era solteiro) sobre os quais, justamente, não teria meação o(a) companheiro(a) supérstite.

Outro exemplo são os bens havidos com cláusula de incomunicabilidade. Em suma, todos aqueles não comunicáveis, como reza o art. 1.659 do CCB.

Extrajudicialmente

É importantes destacar que extrajudicialmente a partilha causa mortis decorrente de relacionamento de união estável poderá ser resolvida sem a necessidade de ação judicial, como esclarecem os arts. 18 e 19 da resolução 35/2007 do CNJ, desde que inexista, claro, litígio entre os interessados.

Por fim, a didática decisão do TJSP que amparada em precedentes do STJ e enunciado da justiça federal dão a melhor interpretação a esse recorrente caso de sucessão, deixando claro que no mesmo inventário pode o(a) viúvo(a) receber meação e herança:

TJSP. 2264815 — 56.2021.8.26.0000. J. em: 18/11/2021. Agravo de instrumento. Ação de arrolamento/inventário.

Decisão que determinou a retificação do plano de partilha anteriormente apresentado e com relação aos bens adquiridos durante a constância da união, a companheira do de cujus terá direito apenas à meação. Insurgência da inventariante.

Não acolhimento. Companheira sobrevivente é meeira dos bens comuns, só concorrerá com os descendentes se houver bens particulares, e somente quanto a esses bens, pois quanto aos bens comuns ela já teve sua participação garantida por meio da meação. Incidência do disposto no artigo 1.829, I, do código de processo civil. Enunciado n.º 270, da III jornada de direito civil do conselho da justiça federal. Doutrina. Precedentes desta 3ª câmara de direito privado, do e. STJ e do c. STF. Decisão mantida. Recurso desprovido”.

Por Julio Martins Advogado, com especialização em Direito Notarial, Registral e Imobiliário, Direito Processual Civil, Direito do Consumidor, Direito da Família, Planejamento Sucessório e Patrimonial assim como Direito das Sucessões. 

Vanessa

Publicitária com experiência em veículos de comunicação, é responsável por conteúdos, gerência, parcerias e mídias sociais.

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