Em sede de inventário a análise de eventual regime de bens, nas hipóteses em que o autor da herança tenha falecido casado ou vivendo em união estável é importantíssima, lado a lado com outros fatores.
Como, por exemplo, a forma de aquisição dos bens e o tipo dos bens deixados. tudo isso corretamente analisado à luz da legislação vigente ao tempo do evento morte trarão o correto direcionamento para apurar a partilha que porá fim (CF. art. 2.023 do CCB) ao estado de indivisão oriundo da comunhão hereditária instaurada com a abertura da sucessão.
No que diz respeito ao regime da separação de bens, como já falamos aqui, ela pode importar em diversos efeitos em sede de inventário.
Inicialmente é preciso anotar que a separação convencional de bens é aquela que é pactuada voluntariamente por pacto antenupcial, que exige a forma pública (art. 1.653) e deve ser encartado no procedimento de habilitação para o casamento (art. 1.525 e seguintes).
Já a separação obrigatória (ou ainda, separação legal) não se convenciona: ela é imposta por lei quando, por exemplo, estiverem presentes as hipóteses do art. 1.641 do códex:
“Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento:
Em tais hipóteses, temos que incidente será também a regra da súmula 377 do STF (editada em 03/04/1964), que assevera:
“No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”.
Todavia, é importante destacar que desde 23/05/2018 o STJ assentou entendimento, em sede de revisão, de que no regime da separação legal de bens será necessária e fundamental a comprovação do esforço comum.
Isso para que então seja admitida qualquer comunicabilidade de bens ao supérstite quanto aos adquiridos onerosamente na constância do casamento – fato que até então não era necessário e, convenhamos, dava contornos de comunhão parcial de bens ao regime ora analisado.
De fato, analisando cuidadosamente as atuais e complexas regras do art. 1.829 vemos que aquele que for casado no regime da separação legal de bens não será herdeiro em qualquer hipótese, na forma do inciso i – só restando ao (à) viúvo (a) direito hereditário na exclusiva hipótese do inciso iii.
Quando então o regime de bens em nada afetará, mas desde que observadas as regra dos arts. 1.830 c/c 1.838, não havendo se falar em “concorrência” (nos casos dos inc. i e ii). outrossim, com base no recente entendimento do STJ (ERESP 1623858/MG. j. em 23/05/2018).
Somente haverá meação em favor do supérstite casado no regime da separação legal de bens se efetivamente comprovado o esforço comum, fato que somente se admite em sede de inventário extrajudicial com a plena concordância dos demais herdeiros já que na via cartorária não se admite o litígio não solucionado, incompatível com as soluções extrajudiciais.
A jurisprudência do TJRJ com o acerto costumeiro afastou o óbice imposto pelo oficial do RGI que negou o registro de formal de partilha sob o equivocado entendimento de que seria necessária a averbação prévia de “pacto antenupcial”.
Caso fosse o regime da separação convencional de bens, quando então a viúva seria herdeira ou, se a hipótese fosse de separação legal de bens que a mesma deveria figurar como meeira – e tudo isso com base na ultrapassada interpretação da súmula 377:
“TJRJ. 0002819 — 67.2021.8.19.0001. J. em: 09/06/2022 – conselho da magistratura. remessa necessária. Serviço registral. Dúvida Suscitada pelo Oficial do Cartório do 3º Ofício de Registro de Imóveis da Capital/RJ.
Requerimento de registro de formal de partilha extraído de inventário. Negativa do ato pelo registrador. Exigência de averbação do pacto antenupcial na matrícula do imóvel. Sentença que julgou improcedente a dúvida. (…). Impertinência da exigência registral. Uniformização da jurisprudência do STJ no sentido de que a comunicabilidade dos aquestos, conforme a súmula 377 do STF, não se presume, pois depende de prova de esforço comum (EREsp 1623858/MG, Rel. Ministro Lázaro Guimarães, Desembargador convocado do TRF 5ª Região, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 23/05/2018, DJe 30/05/2018).
No presente caso não há nenhum indício capaz de atrair a conclusão de esforço comum do cônjuge supérstite.
Consequentemente, não subsiste o regime de bens como obstáculo ao registro pleiteado, observando-se que a comprovação de eventual esforço comum poderá ser feita pelas vias ordinárias.
Sentença de improcedência da dúvida que se confirma em reexame necessário”.
Portanto, só há que se falar em”herança”, na separação legal de bens, se for o caso do inciso III do art. 1.829, sendo somente possível se cogitar em”meação”desde que comprovado o esforço comum para a aquisição onerosa dos bens conforme o novo entendimento oriundo da releitura da Súmula 377 do STF (EREsp 1623858/MG) – e desde que, é claro, os bens admitam comunicabilidade…
Por Julio Martins Advogado, com especialização em Direito Notarial, Registral e Imobiliário, Direito Processual Civil, Direito do Consumidor, Direito da Família, Planejamento Sucessório e Patrimonial assim como Direito das Sucessões.
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